quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Hable con Ella

Ai Almodovar, sempre tu!
Escutando a belíssima e intimista trilha de Hable con Ella, comecei a recordar quando encontrei o maestro em Madri e como esse encontro desnudou mais um pouco de mim.

Era tarde da noite. Havia atravessado a cidade para chegar a um pequeno cinemito de bairro onde os filmes eram legendados ( ao contrário do horror dos grandes cinemas da Espanha onde os filmes são dublados em espanhol), resguardado o audio original. Num acesso de ufanismo escolhi na grade de programação o igualmente incrivel Madame Satã ( direção de Karim Ainouz) e lá me fui, toda catita, para minha sessão mui cool de cinema.
Logo que entro no muquifinho - sim, era um muquifinho . 2 ou 3 salas de exibição, totalmente underground, perto de umas lojas de gosto duvidoso e em uma rua deserta -  para meu total espanto dou de cara com 'O' cara: ele, o mestre, o tudo, Pedro Almodovar em carne, osso, exagero e cabelos.
Congelei! Fiquei abê, abá, abú e nem minha câmera consegui sacar. Só consegui babulciar maestro, maestro, ao que ele me olhou, provavelmente acreditando ser eu catatônica ou something, gentilmente sorrindo.
Pronto! Era isso! Passou! Ele saiu do cinema, dobrou a esquina e foi fazer sabe-se lá o quê naquela noite.
Até hoje não acredito em mim por não ter reagido. Por não ter saido de minha concha de devoção e idolatria e ter-me atirado aos pés dele, beijado suas mãos, suas faces, me agarrado a ele e provavelmente ter parado na delegacia depois. Não interessa!
Descobri assim, da pior forma, que não sou preparada para as surpresas. As boas pelo menos! Sempre fico parada com cara de paisagem esperando o velho winchester processar a informação. Acho que esta inamovibilidade esta ligada a um episódio de minha infancia, quando meu pai me apresentou o Capitão Gancho do Sítio do Pica Pau Amarelo (primeira versão, que fique bem claro).

Congelei de medo! Embora o simpático senhor que apertava a minha mão nada tivesse de amendrontador, eu reconhecia naqueles olhos, ah naqueles olhos de velho lobo do mar, azuis como céu, o malvado e desumano Hook. Deve ser isso. Provavelmente.
Provavelmente nunca mais encontrarei Almodovar. Pelo menos não assim ali ao meu alcance, tão pertinho de mim, tão sozinho (do que me recordo havia mais alguem com ele, de preto, alto e forte, com cara de segurança), mas independente de quem fosse, não contava. Provavelmente nunca mais terei a oportunidade de dizer em meu ótimo espanhol (hehe), tudo o que ele e seus filmes tem feito por mim, o descortínio de minh'alma feminina como tão impressionantemente antes, somente Chico havia feito. O Buarque, claro.
De qualquer sorte, as experiencias vividas servem pra isso: encher nossa mochila para que dali retiremos as ferramentas quando necessário.
Ainda hoje paraliso frente as surpresas inusitadamente boas. Reajo com cautela.
Ainda amo Almodovar.
Ainda me derreto pro Chico.
Do Capitão Gancho...não tenho mais medo.



No longa, Lázaro Ramos faz o papel de João Francisco dos Santos, mais conhecido como Madame Satã. O personagem é um transformista, boêmio, frequentador do bairro da Lapa, no Rio de janeiro, na década de 1930. O filme mostra o círculo de amigos e o cotidiano de João Francisco dos Santos antes de se tornar “Madame Satã”. O verdadeiro ”Madame” transformou-se em figura singular no cenário carioca do período de 1930.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

A fera em nossas entranhas ou as entranhas da fera?

Ok. Ja matei a princesa. Ja abri o baú de guardados, minha caixa de Pandora pessoal. Passei, ajoelhada, pelas agulhas e alfinetes. Tambem ja descobri que na realidade, sou a princesa e o principe. O motorista e o cobrador e tambem o passageiro (talvez seja a estação, mas não quero nem pensar nisso que ai já é filosofia profunda!). Esse não é o grande barato da vida? Pode ser o caro também.
Depois de matar todo mundo então, começa o processo de se virar do avesso (ou será sair do avesso?). Não achei metafora visual mais própria (ok) e charmosa, do que Marlene, a inigualável Marlene, saindo de dentro de um gorila.
Na real, ela não 'sai de dentro' da fera. Ela é a fera. Ela se despe da fera pra virar a Madonna.
É o ultimate moment da transformação! Nada de crisálidas e borboletas!
Mulher que é mulher passa de primata para diva!
Borboleta já fui há muitos, tá na hora e vez da gorila. Estou tirando as mãos...


domingo, 27 de setembro de 2009





Psiquê descobre Eros - Maurice Denis, 1908
Museu Estatal Hermitage, São Petersburgo
Copyright ©1999 State Hermitage Musuem.

Eros e Psique

 
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.

Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.

A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.

Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o Destino —
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.

E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora.



E, inda tonto do que houvera,
A cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.




Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"

sábado, 26 de setembro de 2009

Post to a dead Princess

'Depois de algum tempo, pararam de sentir que tinham perdido a cabeça, e agiam como se estivessem sozinhas, (...), falando abertamente sobre o que havia sido sempre fechado , rindo sem querer da chocante comédia do desejo, das coisas absurdas que os homens querem e das coisas igualmente absurdas que a mulheres fazem para agradá-los, até que os anos descolaram-se delas e elas lembraram da própria juventude, recordaram como haviam aprendido aqueles segredos cooutras mulheres severas, ferozes, que também haviam se dissolvido, depois de um tempo, em gargalhadas de alegria, lembrando, por sua vez, como o conhecimento havia sido dado a elas e ao final o riso da sala era o riso da gerações, de todas as mulheres e da historia.'
(Salman Rushdie, A Feiticeira de Florença)

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Needles and pins?

Então lá estava ele, parado a olhar! Parado como se ali fosse o unico lugar do mundo para estar, lugar ocupado com tanta propriedade e segurança. Como se ocupar aquele aquele espaço/tempo/lugar fosse direito adquirido atráves de seculos e universos...como se toda sua existência o tivesse conduzido, convergido para aquele momento... Como se ali fosse exatamente onde ela esperava que ele estivesse. O único lugar possível para estar. "I saw her today, I saw her face It was the face I loved, and I new I had to run away And get down on my knees and pray, that they go away And still it begins, needles and pins Because of all my pride, the tears I gotta hide Oh I thought I was smart, I stole her heart I didn't think I'd do, but now I see She's worse to him than me, let her go ahead Take his love instead, and one day she will see Just how to say please, and get down on her knees Oh that's how it begins, she'll feel those needles and pins Hurtin' her, hurtin' her Why can't I stop, and tell myself I'm wrong, so wrong Why can I stand up, and tell myself I'm strong Because, I saw her today, I saw her face It was the face I loved, and I knew I had to run away And get down on my knees and pray, that they go away And still it begins, needles and pins Because of all my pride, the tears I gotta hide Needles and pins, needles and pins, needles and pins" (needles and pins - ramones)